e caminhos contínuos não me fariam possível. porque tudo o que eu tenho são desejos ao meio. coisas difíceis de entender. coisas sem palavras ou palavras vazias.
e na estreiteza das longas horas um abismo é um ponto infinito e que faz doer sentidos. o papel em branco é um pedido de socorro.
(gosto de estar sozinha nas horas mortas porque eu, acontecendo, sou um provérbio imprevisível.)

Publicado em palavras . Deixar um comentário

– o que você não sabe é que é por isso que castelos são derrubados e por isso hoje existe uma árvore onde um dia foi a sala de estar que um dia acolheu uma senhora em prantos ajoelhada ao pé de alguém que morreu sem ter se dado conta de que aquela seria a única vida inteira que teria um dia. as coisas se ligam todas umas às outras e se acariciam e se ferem, se confundem e se transformam. saber da inconstância das coisas não elimina a inconstância das coisas. e o que é real mesmo são as agregações de absurdos que só não são aceitas como tais por acharmos que o nosso conceito de real é mais real que a realidade. o período entre o não-acontecer e o desacontecer nao é mais obscuro que o período entre as coisas que nascem, crescem, se reproduzem e morrem. tentar não ser uma raíz incrustada em um dos cantos do céu é uma coisa tão necessária quanto. fisgar pitadas de chão. moer séculos e séculos de sereno em peitos quentes.

Publicado em palavras . Deixar um comentário

tenho sentido em voz baixa para que o lado de lá das imagens não perturbe vãos.
e tenho dito coisas em segredo, aos pedaços, porque o desejo de falhas e pequenos horrores não esteve previsto.
na verdade ando dando passos vermelhos porque se, algum dia, alguém morrer por uma causa implosível, dessas pelas quais eu já morri seca, e se morrer não for tão leve assim e se a dor, dor mesmo, ninguém ainda nunca conheceu… e se, nesse dia, nada mais for informação sensível e se segurar a pessoa pelas asas for o mesmo que nada. seria um ironia discreta e indissolúvel.
outras margens são mais planas. existem mulheres e mulheres. as que tem cortes profundos no eixo. as que derramam instantaneidades. e quando são rochosas de puro silêncio e quando as camadas se entrelaçam sem se encobrir, então é possível que ela seja o próprio tempo. ( houve uma vez em que fugi. é uma história linda. )
mas, de fato, pronunciar saudades para o centro de gravidade pode ser uma via de acesso a, mas não me fará voltar…
tendo isso em mente, aceitar calamidades é um indivíduo de prazer.

Publicado em palavras . Deixar um comentário

(coisas insones)

o corpo todo perder a noção da hora e não haver relógio que amenize a frustração de não querer fazer parte de um mundo que funciona com ou sem você. tempo congelado o suficiente pra não apodrecer por completo. mas não o suficiente para tocá-lo e sentir prazer.
coisas coisas coisas. um dia só, longo, com mais pontes que paredes. uma escada torta branca fraca que sai de um ponto da sala que ninguém nunca alcancaria. e leva para um outro onde ninguém conseguiria viver. às vezes é besta mesmo, a vida.
um pijama pendurado sozinho, às três da manhã, num cabideiro acéfalo. cadeiras monótonas, janelas fechadas (porque a essa hora o jardim não me pertence). de mim sai mais fumaça do que realmente entra. desconfio que parte dessa fumaça já habite o meu peito e saia a noite só para tecer espaços vazios.
todas as medidas do homem. a mão, a cabeça e os joelhos determinando a altura de tudo. momentos em que eu percebo que pessoas moram sobre a minha cabeça. os canos que não param de fingir tempestades ao meu redor. o urso dos canos.
a noite é a hora em que só o meu coração bate e todos os deuses pedem perdão. o céu impedido. o mundo a casa e eu.

Publicado em palavras . Deixar um comentário

não há fragmento que não contenha verdades do todo e devaneios das partes. nem repetição que não seja ato de criação.
não há nada que exista quase ao alcance e que não suscite nas mãos sentimentos incontroláveis de deus contrariado.
o espaço restrito. o tempo ralo ralo mas infinito. e nada parar pra você, por você; existir ao vivo é imperdoável.
e a linha que divide um dia do outro é uma fenda. é exatamente o que o deixa escapar. é uma verdade que está sempre sempre sempre a beira de se descobrir e que tudo continua, inapreensível.
não há imagem que não tenha existido desenho em algum momento. não há desenho que não seja fruto e foz de desejos.

Publicado em palavras . Deixar um comentário

toda vez que eu chorar dando explicações cuja lógica lhe foge. toda vez que eu fugir por medos ridículos ou enfrentar tempos cruéis com o coração frio. toda vez que eu desenhar com as mãos no ar estranhas e rígidas delimitações de espaços dos quais eu preciso. todas as minhas mortes súbitas em meio a um dia qualquer. escolher caminhos mais longos por motivo nenhum. hora muerta. cada cigarro fumado com uma legenda gravada na bituca. cada vaso de planta devidamente mapeado e arquivado. palavras que começam com in e terminam com ável ou ível ditas a todo instante. instrumentos invisíveis. íveis. coisinhas. parede. pronomes possessivos. microhistórias. tudo que nunca vem inteiro. todas as operações sobre o sentido das coisas, alimentando monstros inexistentes. diminutivos. agoniazinhas. gramática, literatura, artes plásticas e vídeo-game. cultura inútil. pequenas paixões. pretérito perfeito. coisas últimas. sistemas. caos. dores internas. eremita. egoísta. não saber dar satisfação. não conseguir usar o telefone sem que seja imprescindível. não achar nada imprescindível a ponto de usar o telefone. cantar todas as músicas mais sofríveis com os olhos fechados e as mãos sem lugar. necessidades de ar. achar o elefante um absurdo. falar eu te amo quando queria falar outra coisa. nunca ter certeza completa absoluta de nada. espantos com momentinhos comuns. agressividade inesperada. punir quem me ama. olhar nos olhos de alguém com raiva, raiva mesmo, na testa. fechar-se. retirar-se. dilemas, silêncios, caules de plantas, falta de vontade, livros infantis, cantos, promessas vagas. promessas de morte. cinzeiro cheio. ter a carne fraca. necessidade de lugares pequenos. de paredes. não dormir. sonhar acordada. tudo isso e muito mais. coisas que você não entenderia. ( e eu não quero te fazer sofrer )

Publicado em palavras . Deixar um comentário

porque duzentos tremores não me fariam feliz e uma flor no peito não é coisa que se peça a deus nenhum.
às vezes, costurando abismos uns nos outros eu vejo que ter pele ao redor de tudo é só um pedido de perdão no qual eu quis acreditar.
não, não era real sentir. não há delicadeza em ter os órgãos expostos.

Publicado em palavras . Deixar um comentário

um sino toca distante de tudo. da noite do quarto não o vejo mas, se visse, provavelmente confirmaria o que eu senti:
distante ele está até dele mesmo. o gemido é de puro vazio.

eu concebo pequenas ventanias.
eu vento e por onde passo tudo engole certa dor.

Publicado em palavras . Deixar um comentário

um beijo na boca e outros dias.
hoje ele não está mais. e se estivesse, ao ponto mesmo de me beijar, beijaria a memória de mim. ou de outra mulher. assim eu penso. porque quando ele me olha o mundo dele não para mais. nem gira mais depressa. quando ele me olha é quase nada.
e eu, misto de dor e silêncio.

Publicado em palavras . Deixar um comentário

estou presa em um mundo que provavelmente não é o que enfim…
tudo em que toco se faz impossível e a tempestade no peito não poderia ser mais ridícula. assim eu aprendi, incontornos.

todo pequeno terror que eu momento. toda voz em que me recolho.
existir ao vivo é inalcançável.

Publicado em palavras . Deixar um comentário